Pôr do Sol no Alentejo

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sexta-feira, 27 de março de 2015



A meio da noite Manuel acordou com uns barulhos estranhos, levantou-se e muito receosamente dirigiu-se para o local do murmúrio, a lua cheia, iluminava totalmente o quarto com uma luz diáfana.
Uma dezena de estranhas criaturas estavam reunidas num dos cantos do quarto: eram todos diferentes uns dos outros, uns usavam chapéu, outros não e todos eles vestiam uma espécie de camisa de dormir, não tinham rosto, nem mãos, nem pernas, apenas se via roupa moldada por um corpo inexistente.
Os primeiros momentos de pavor de Manuel foram substituídos por uma corajosa reacção! Tinha lido num livro há muito tempo atrás, que os fantasmas eram só ar e dessa forma era-lhes impossível causar qualquer dano físico a quem quer que fosse. Também tinha lido no mesmo livro que para os afastar bastava lançar sal sobre eles.
Manuel correu à cozinha e afortunadamente o saleiro estava cheio de sal! Pegou no saleiro, dirigiu-se ao quarto onde estavam os fantasmas e lançou-lhes sal para cima. Muitos desfizeram-se logo ali e os outros fugiram apavoradamente. Manuel viu que dominava bem a situação e resolveu acabar com todos os fantasmas, por isso decidiu dar-lhes caça.
Procurou primeiro nas divisões do andar de cima e depois desceu as escadas para o rés-do- chão. Procurou primeiro na cozinha, depois na biblioteca, na casa de banho e finalmente na sala comum, que era a maior divisão da casa. A luz branca da lua que entrava pelas grandes janelas dava-lhe um ar funesto e arrepiante. Manuel entrou e parecia-lhe tudo diferente, desde a primeira vez que tinha estado na sala, quando chegou durante o dia. Agora tudo aquilo lhe parecia misterioso. Viu então, encostados à parede perto da lareira, três estátuas em tamanho natural, Manuel pensou muito intrigado como foi possível ele não ter visto as estátuas quando esteve ali esta tarde. Caminhando na sua direcção, verificou perplexo, que as estátuas eram esqueletos. Aproximou-se mais para ver melhor, averiguou que eles estavam armados: um tinha uma lança, outro, um grande machado e o terceiro, uma espada. Manuel esquecera-se completamente dos fantasmas. Ficou completamente hipnotizado pelos esqueletos, porém, havia algo neles de tenebroso que o deixava receoso de se aproximar mais. Manuel, para ver um pouco melhor, debruçou-se sobre uma mesinha de apoio, existente no local e nesse preciso momento, é-lhe lançado um terrível golpe de machado…

segunda-feira, 16 de março de 2015



 O orgulho é a certeza emotiva da grandeza própria. A vaidade é a certeza emotiva de que os outros vêem em nós, ou nos atribuem, tal grandeza. Os dois sentimentos nem necessariamente se conjugam, nem por natureza se opõem. São diferentes mas conjugáveis.

O orgulho, quando existe só, sem acrescentamento de vaidade, manifesta-se, no seu resultado, como timidez: quem se sente grande, porém não confia em que os outros o reconheçam por tal, receia confrontar a opinião que tem de si mesmo com a opinião que os outros possam ter dele.

A vaidade, quando existe só, sem acrescentamento de orgulho, o que é possível porém raro, manifesta-se, no seu resultado, pela audácia. Quem tem a certeza de que os outros vêem nele valor nada receia deles. Pode haver coragem física sem vaidade; pode haver coragem moral sem vaidade; não pode haver audácia sem vaidade. E por audácia se entende a confiança na iniciativa. A audácia pode ser desacompanhada de coragem, física ou moral, pois estas disposições da índole são de ordem diferente, e com ela incomensuráveis.

Alguns textos autobiográficos ou filosóficos de Fernando Pessoa, do seu livro do desassossego, continuam me deslumbrando. Não resisto à tentação de transcrever alguns!

quinta-feira, 12 de março de 2015




"O meu mundo não é como o dos outros, quero demais, exijo demais; há em mim uma sede de infinito, uma angústia constante que eu nem mesma compreendo, pois estou longe de ser uma pessoa; sou antes uma exaltada, com uma alma intensa, violenta, atormentada, uma alma que não se sente bem onde está, que tem saudade… sei lá de quê!"
 Florbela Espanca

terça-feira, 10 de março de 2015



Deus criou-me para criança, e deixou-me sempre criança. Mas porque deixou que a Vida me batesse e me tirasse os brinquedos e me deixasse só no recreio, amarrotando com as mãos tão fracas o bibe azul sujo de lágrimas compridas? Se eu não poderia viver senão acarinhado, por que deitaram fora o meu carinho? Ah, cada vez que vejo nas ruas uma criança a chorar, uma criança exilada dos outros, dói-me mais que a tristeza da criança o horror desprevenido do meu coração exausto…

Fernando Pessoa  em: O Livro do Desassossego.

domingo, 8 de março de 2015



"A velhice começa quando as lembranças são mais fortes que a esperança."
 Provérbio Hindu






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